sexta-feira, 29 de maio de 2009

OPINIÃO

“Um Reino Mágico de Fantasia”
SER(á) no treino?!

por Mara Vieira

Era uma vez um “reino mágico de fantasia” onde tudo acontecia: correr, saltar, trepar, cair, gritar, rebolar, sorrir… Nesse reino onde tudo era possível havia vários tempos e espaços onde meninos e meninas agiam espontaneamente num imenso espectáculo de imagens e sensações. Era o reino do faz de conta, no qual a bola era o objecto mais amado com o poder de encantar e hipnotizar. Assim, sem se saber como nem porquê eis que todos se preparavam, dia após dia, para mais uma celebração: “Ir jogar à bola”. As leis desta celebração eram a do “contágio” em torno do objecto amado e a da “atracção” pelo qual todos se reuniam em comunhão. Também, comungavam da mesma vontade: viver e criar momentos de fantasia. O(s) celebrante(s) era(m) eleito(s), naturalmente, pelo poder do que evocavam: fintas, dribles, simulações... Verdadeiras “fórmulas mágicas”! Emergia, assim, uma simpatia pelas formas imitativas e miméticas que convertiam o celebrante no próprio poder que ele conjurava.

Era o maravilhoso reino da infância onde tudo era mágico! Onde, inconscientemente, se viviam as primeiras experiências, talvez as mais antigas do encontro do Homem com a fantasia criativa da sua cultura. Partindo destas recordações e vivências, mas, fundamentalmente, pelo trabalho desenvolvido nos últimos anos com jovens jogadores, arrisco dizer que é urgente reequacionar a concepção e intervenção no treino de crianças/jogadores sob pena de “matar” em vez de fazer “desabrochar”.

Para isso, o treinador não deve ser um técnico armado de conceitos, tantas vezes abstractos (como, por exemplo, “jogar em bloco”, “jogar nas e entre linhas”, “manter o equilíbrio da equipa”,...), mas um contador de histórias que contempla e respeita o “reino mágico de fantasia” fazendo do processo de treino e do jogo uma história interminável, na qual cada criança/jogador parte das suas potencialidades e da sua singularidade rumo à transcendência.

A história que se conta, também ela singular, é o nosso jogar! E é a que quisermos!... “Era uma vez uma equipa que tinha um castelo onde ninguém podia entrar. Nesse castelo havia uma princesa (baliza), que tínhamos que salvar dos maus (adversários), mas também havia guardas e dragões. Os guardas protegiam as portas e janelas e os dragões estavam no meio do castelo para expulsar os que se atrevessem a entrar…”. E as crianças, pelo menos as mais novas, entendem bem a linguagem dos símbolos dos contos. São elas que inventam no seu dia-a-dia o jogo do “faz de conta” e tantos outros que as divertem e distraem em tempos vividos entre a imaginação e a realidade. Assim, ainda que a criança necessite de contrapontos para situar a sua própria vivência e o seu equilíbrio talvez não se deva “explicar” o sentido dos “contos”. As imagens e as acções são “as palavras explicativas”.

Príncipes, fadas, duendes, castelos, casas, florestas enormes…”ronaldos”, “messis”, “robinhos”, “zidanes”… guardar portas e janelas…. São imagens e acções simbólicas que oferecem a possibilidade da(s) criança(s) sair(em) vitoriosa(s) do “conto” - o nosso jogar - desde que a linguagem toque directamente no inconsciente, ajudando-a(s) a colocar(em) ordem no seu mundo interno. Ao ouvir um conto ocorre, ou não, a identificação. Se ele for condizente com a situação interna, a identificação é imediata e dá forma para enfrentar as dificuldades. Paralelamente, enriquecem-se as brincadeiras que dão forma ao(s) desejo(s): SER jogador de futebol!

A imaginação da criança constrói-se com símbolos extraídos da realidade, que reforçam as suas estruturas e alargam os seus horizontes, desde que num ambiente rico de impulsos e de estímulos. Como refere Jung, “Quando crianças, vivemos num mundo mágico e mitológico porque para além dos instintos e impulsos, somos arrebatados pela imaginação”. Penso que é a imaginação que dá as crianças aquele brilho nos olhos, um tom rosado nas bochechas, os sorrisos e os comportamentos espontâneos e inesperados. E é nesse momento que elas fazem qualquer pedrinha virar uma bola encantada brincando com “o conto” em qualquer espaço: nos jardins, na rua, em casa…

Neste sentido, promover a brincadeira no treinar é fundamental, não pela simples recordação de impressões vividas, mas pela reelaboração criativa do nosso jogar. Um processo através do qual a criança combina entre si os dados da experiência para construir uma nova realidade, que responde às suas curiosidades e necessidades. Todavia, “é preciso que disponha de tempo livre para inovar e tomar iniciativas sem precisar, a toda a hora, da autorização de um mestre para lhe indicar um bom caminho”, diz-nos Étienne Guillé. Uma parte difícil de assumir pelo treinador, uma vez que tem que estar preparado para aceitar formas de espírito muito diferentes da sua. Portanto, há que deixar de papaguear expressões como: “vai, vai”, “depressa, depressa”, “joga atrás, agora à frente”, “chuta que não tens ninguém”, “finta”, “joga na raça”, “queima terreno”. Como já aqui alertou Vítor Frade, “só faz sentido existir o treinador se este for interventivo, mas interventivo no sentido de catalisador da apreensão de tudo aquilo que é conveniente e importante para o crescimento do processo”.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

QUEM FALA ASSIM NÃO É GAGO

"Este Barça, y de ello me alegro, ha impuesto un estilo de juego que ha provocado millones de elogios en todos los rincones del mundo. Y ha escrito, con letras grandes y de oro, el mensaje de texto más difundido del 2009: se puede ganar jugando bonito, dando espectáculo. Copien esta propuesta. Si se atreven."
Johan Cruyff, em elPeriódico.com a 28 de Maio de 2009

VALE A PENA LER DE NOVO

Responder à pressão
A receita avançada para o jogo do Bessa não era nova: “O Sporting joga bom futebol, mas tem de fazer um jogo de sacrifício”; “É preciso que os jogadores leoninos corram tanto ou mais do que os adversários”; “O Sporting tem de aliar um grande espírito de sacrifício e de luta à boa capacidade técnica que possui”. Lugar comum, ou não se tratasse de um jogo com o Boavista.
Peseiro, coerente, contrariou esta lógica do “temos de jogar com as mesmas armas do adversário para ganhar o jogo” e respondeu noutro registo... com qualidade de jogo!
O Boavista, invariavelmente, procura primeiro não deixar jogar, utilizando até à exaustão um “pressing” homem a homem. Pacheco chama-lhe “jogar em pressão”.
Porém, frente ao Sporting, a sua usual eficácia desapareceu e ficou à vista uma grande desorganização defensiva. Porquê? Porque o Sporting respondeu com circulação de bola, mobilidade, trocas posicionais e rapidamente colocou a nu as muitas fragilidades e incoerências do “pressing” quando perspectivado homem a homem.
Para ter eficácia, Pacheco teria de fechar a equipa e partir para uma pressão colectiva, zonal. Mas as suas referências defensivas são outras... E percebe-se a “vertigem” pelo “fisicismo”. Alguma coisa tem de compensar tal (des)organização.
Com uma equipa que se esforça por não deixar jogar e que não se coíbe de cortar em falta qualquer lance mais ousado, a solução ajustada não é “correr tanto ou mais que o adversário”... É fazer correr a bola, não fixar o alvo da pressão adversária, não lhe dar tempo de fazer falta! Sobretudo na primeira parte, Peseiro deu uma aula de como jogar contra equipas com as características do Boavista de Jaime Pacheco.
Já hoje, o “jogo de pressão” do Boavista pode voltar a ser extremamente eficaz. Sem a alta circulação de bola de outrora, o FC Porto que se cuide...
Nuno Amieiro, na revista Record DEZ de 9 de Abril de 2005

segunda-feira, 25 de maio de 2009

A frase anterior pertece a Guardiola. Foi assim que se referiu, certo dia, a Iniesta.

QUEM FALA ASSIM NÃO É GAGO

Não usa brincos, não tem tatuagens, tem o cabelo curto, não embirra por jogar apenas vinte minutos e, no entanto, é o melhor de todos.
Guardiola

sexta-feira, 22 de maio de 2009

PERIODIZAÇÃO TÁCTICA, o que nos diz Vítor Frade

Tempo para treinar (II)
"Para o treinador, um dos grandes problemas é o tempo. Ele não tem muito tempo. Não se pode treinar muito tempo. Quando muito, o treino de quarta-feira pode ir além da hora e meia, mas os restantes é conveniente que não a ultrapassem."
Frade (1998)

quinta-feira, 21 de maio de 2009

FUTEBOL (COM) SENTIDO

Parte III
Pivô e ponto final

Embora não seja obcecado por preciosismos terminológicos, penso que o uso acertado dos termos, tendo em conta aquilo que estes se propõem representar, é de grande importância e, no caso do pivô, poderia evitar alguns dos muitos mal entendidos que se verificam em torno de tal função. De facto, não raras vezes, verifica-se um recurso indiferenciado e desajustado dos termos “pivô defensivo”, “pivô ofensivo”, “trinco” e “pivô”.

Ora, por definição, um pivô é “um eixo vertical fixo à volta do qual gira uma peça móvel”. Se olharmos para aquela que é, de momento, a equipa que denota maior qualidade de jogo a nível internacional, o Barcelona, verificamos, tal como é salientado no texto “Um divórcio anunciado”, que se trata da “equipa que melhor espelha esta forma peculiar de atacar subjacente à presença em campo de um pivô”. Guardiola, parecendo evidenciar no banco a mesma lucidez que mostrava em campo, mostra-nos que o desempenho bem sucedido da função de pivô é determinante para a dinâmica colectiva da equipa. E, para mim, somente em equipas onde o pivô é a grande referência faz sentido, de facto, tal designação, visto que é à sua volta que gira uma peça móvel: um determinado jogar.

Embora na definição de pivô este seja sugerido como algo fixo, importa perceber que, no Futebol, esta ideia de fixo não deve ser entendida como um fixo estático. Confuso? Talvez um pouco. Mas passo a explicar. Este “fixo” (para mim o mais posicional de todos os jogadores) tem de ser relativizado, devendo ser entendido como uma referência permanente do jogar da equipa, o tal “farol”. Isto é, tal como um farol, o pivô deve ser uma referência de segurança, alguém que ilumina o jogar da equipa e que, apesar de uma acção e funcionalidade aparentemente intermitente (porque não tem sempre a bola), a sua luz nunca se apaga, está sempre presente, surgindo para dar luz aos companheiros. Caso essa luz não fosse intermitente, estaríamos a deturpar aquela que é, para mim, a essência do Jogo. Isto é, se essa luz brilhasse sempre, seria a expressão de um jogar em que a equipa se subjuga ao jogador e não a expressão de uma equipa onde o pivô, pelo seu potencial, confere equilíbrio, clarividência e qualidade à organização colectiva.

Importa ainda esclarecer que, como tão bem afirma Vítor Frade, o pivô deve ser um “farol” e não um “pirilampo”. Poderá pensar-se que me estou a contradizer, porque afinal um farol, tal como um pirilampo, também emite uma luz intermitente. No entanto, o tipo de intermitência de um é diferente da do outro. Isto é, enquanto que a intermitência do “farol” é regular e, por isso, benéfica para a equipa, a luz intermitente do “pirilampo” é esporádica e irregular, intermitente de um modo indefinido, não podendo, por isso, ser uma referência para a equipa. Mesmo que, por vezes, essa luz possa até ser mais intensa do que a de um “farol”. Mas isso não passa de um fogo de vista que acaba por nos iludir. Se eu estiver no mar perdido e vir um farol sei que, quanto mais perto me encontrar deste, mais próximo estou de terra. Contudo, se estiver perdido numa pradaria e vir a luz de um pirilampo e a seguir, irei para onde este quiser. Esta é a grande diferença entre os “faróis” ou “rosas-dos-ventos” e os “pirilampos” ou “cata-ventos” do Futebol! Enquanto os primeiros centram a sua acção num referencial colectivo de jogo, a Cultura de jogo da equipa, os “pirilampos” centram o jogo nas suas acções ou, no caso dos “cata-ventos”, a sua acção no jogo do adversário, acabando ambos por levar a equipa atrás de si, podendo daí, de uma forma linear, advir algumas vantagens, mas também, seguramente, muita instabilidade.

Ainda relativamente às designações de “pivô defensivo” e “pivô ofensivo”, quero realçar que a acção do pivô se centra no jogo, não em atacar, defender ou transitar. O Jogo é “Inteireza Inquebrantável”, logo não faz qualquer sentido este tipo de designações. Pivô é pivô do jogo, do jogo todo e, como tal, as suas funções não se esgotam em defender, atacar ou transitar. Em suma, pivô e ponto final.

Tal como o Nuno Amieiro, também eu me lamento que existam poucas, muito poucas, equipas a jogar neste “comprimento de onda” e poucos, muito poucos, pivôs no futebol de hoje. A prova de que quantidade não é sinónimo de qualidade e de que aquilo que é norma nem sempre interessa. Junto-me a tal murmúrio e acrescento que além deste crime se observam outros no Futebol actual. Por exemplo, ver que jogadores de enorme qualidade e mestres a actuar numa posição e função de tanta especificidade, como a de pivô, são por vezes colocados em posições e funções diferentes. Veja-se o caso de Pirlo. Que desperdício vê-lo jogar regularmente em diferentes posições.

Jorge Maciel

terça-feira, 19 de maio de 2009

OPINIÃO

A lição teórica de Guardiola
por Nuno Amado

O futebol do Barcelona 2008/2009 não deixou ninguém indiferente. Enquanto uns ficaram absolutamente rendidos, outros reagiram de forma mais reservada, considerando que numa competição mais exigente do ponto de vista atlético, como é a Liga Inglesa, por exemplo, esta filosofia teria pouco sucesso. Sem nunca se ousar colocar em questão a qualidade de jogo da equipa catalã, surgiu a velha dicotomia beleza/utilidade e muitos foram os que fizeram a defesa da tese de um Barcelona demasiado “macio”, menos pragmático do que o desejado e servido por um conjunto de jogadores que carecia de músculo. Dizia-se que, em encontros contra equipas atleticamente superiores e assaz competentes do ponto de vista táctico, este Barcelona não se conseguiria impor e que, apesar de praticar o mais belo futebol da Europa, esta não era a forma mais eficaz de se ter êxito.

Em primeiro lugar, há que dizer que num jogo de futebol, como em qualquer outro jogo, o belo é sinónimo de bom. Isto porque em qualquer coisa com um objectivo tão claro, como é o caso do futebol, é impossível aceitar que algo que não possa produzir consequências práticas possa ser belo. Depois, o erro crasso é acreditar que falta músculo a este Barcelona. É evidente que, em termos atléticos, esta equipa não é tão capaz como as grandes equipas europeias, mas o erro está em presumir que uma equipa de sucesso, no futebol actual, necessita impreterivelmente dos melhores atletas, no sentido em que estou a utilizar o termo. A musculatura desta equipa existe, ao contrário do que se pensa, embora seja de outra ordem.

É verdade que este Barcelona é tudo isto com que o caracterizam. Mas nenhuma dessas características tem necessariamente de ser um defeito. E esta é a grande lição de Guardiola. Numa altura em que, muitos pensam, se parece caminhar para um desporto cada vez mais musculado, no qual a força física e as capacidades atléticas são decisivas, este Barcelona vem deitar por terra essa ideia. O bom futebol, o melhor futebol, é aquele que é jogado com a cabeça, aquele que dá preferência aos atributos intelectuais. O futebol de hoje é um jogo de pouco espaço. Para muitos, tendo em conta essa evidência, os jogadores mais aptos serão, portanto, os mais rápidos, os tecnicamente mais evoluídos e os mais fortes. Se há coisa que este Barcelona vem provar é que isso, em rigor, não tem de ser assim. Os mais aptos são os mais inteligentes, os que decidem mais rapidamente, os que conseguem "fabricar espaços", os que possuem maiores índices de criatividade, etc.

É inegável que esta equipa joga um bom futebol, mas a sua grandeza não se esgota aí. Mais do que uma excelente ilustração de bom futebol, trata-se de uma verdadeira lição teórica sobre o jogo. Por trás desta equipa está um conceito que vem quebrar não só com muitos dos paradigmas actuais como também vem contradizer ideias e conceitos que, ao longo do tempo, foram elevados ao estatuto de dogma. Enquanto grande parte dos treinadores diz aos seus laterais para nunca jogar no meio, pois é mais arriscado do que jogar em profundidade na linha, este Barcelona postula o contrário. Os laterais devem jogar no meio, porque é no meio que a possibilidade de criação de apoios é maior e porque é regressando ao meio que as possibilidades de escapar ao “pressing” do adversário aumentam. Enquanto grande parte dos treinadores diz aos seus jogadores para não saírem a jogar caso o adversário pressione muito alto, pois é perigoso, este Barcelona não o admite, seja em que situação for. Um excelente exemplo desta “teimosia” foi a final da Taça do Rei. O Athletic de Bilbao optou, sobretudo depois de se encontrar a perder, por pressionar altíssimo, aquando dos pontapés de baliza do Barcelona. A ideia era fazer com que os defesas catalães não tivessem espaço para receber a bola e obrigá-los a jogar a contragosto, com saídas com pontapés longos. O Barcelona não fez caso disto e, ainda que a grande maioria dos treinadores desaconselhasse a sua equipa a sair a jogar nessas condições, saiu sempre a jogar. Com o auxílio dos laterais e do médio-defensivo, que baixou para servir de apoio, a equipa trocava assim a bola dentro da própria grande área, utilizando toda a largura do campo para criar linhas de passe, até que esta chegasse a uma das linhas. Nessa altura, um médio ou o extremo baixava para servir de apoio vertical e, recebendo a bola do lateral, entregava-a de imediato no médio-defensivo, ficando concluída a saída de bola. Alternadamente, dependendo da forma como o adversário pressionava, saíam também pelo meio, depois de conseguirem puxar os adversários para uma faixa e fazendo regressar a bola rapidamente aos centrais. O que é certo é que nunca desvirtuaram a sua maneira de jogar, mesmo correndo riscos tão elevados. Enquanto grande parte dos treinadores diz que não quer "rodriguinhos", que a equipa tem de ser objectiva, que um passe para trás só se faz em caso de aperto e que uma ideia de progressão deve estar sempre presente quando uma equipa troca a bola, este Barcelona vem dizer que isto não é bem assim e que nem sempre é para a frente que se joga, que a objectividade, quando excessiva, se transforma em previsibilidade. Este Barcelona, como joga, torna-se difícil de parar porque nunca se sabe por onde vai entrar, porque o seu futebol não se limita a fazer o mais simples, o mais objectivo, sendo, pelo contrário, complexo e imaginativo. Enquanto grande parte dos treinadores diz aos seus jogadores que qualquer nesga para chutar à baliza deve ser aproveitada, este Barcelona refuta essa velha máxima e Guardiola já disse mesmo que prefere que os seus jogadores, mesmo dentro da grande área, troquem a bola em vez de chutar à baliza. A ideia é concluir o lance apenas quando as possibilidades de êxito são consideravelmente boas.

Por tudo isto, este Barcelona, mais do que uma equipa que pratica um futebol agradável, mais do que uma rara excepção de sucesso com armas diferentes, mais do que um exemplo de bom futebol, fundamenta-se na destruição de predicados ancestrais. Representa uma autêntica reformulação teórica do jogo. E é algo que, perdurando, pode contribuir para modificar a mentalidade que, nos dias que correm, domina o jogo.
Aqueles que têm por hábito ler os comentários que regularmente vão sendo publicados neste espaço, sabem que eu convidei um seguidor anónimo a "retocar" um comentário que aqui tinha deixado. Fi-lo por achar que o texto em causa merecia, pelas ideias expressas e pela forma como estava escrito, outro lugar de destaque que não o dos comentários. Pois bem, para grande satisfação minha, o Nuno Amado, de Lisboa, aceitou o convite e "retocou" o texto que agora é publicado na secção OPINIÃO. A não perder...
Obrigado Nuno. Por mim, é para repetir!

segunda-feira, 18 de maio de 2009

EM DESTAQUE


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Título
“ROTATIVIDADE DE JOGADORES” no Futebol. Uma relação «umbilical» do como treinar com o como «jogar».

Autor
Sérgio Alves

Orientador
Professor Vítor Frade

Monografia realizada no âmbito da disciplina de Seminário do 5º ano da licenciatura em Desporto e Educação Física, na opção de Futebol, da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

RESUMO
O aumento da densidade competitiva e consequente número de jogos nas equipas de Rendimento Superior / TOP levou, nos últimos anos, ao emergir concepto-metodológico do “princípio da rotatividade de jogadores”. No sentido de compreender esta concepção metodológica para o presente estudo foi seleccionada, sistematizada e discutida informação relativa à complexidade que o «jogar» manifesta e de que forma os treinadores aplicam este princípio metodológico do treino. Os objectivos que o guiaram são os seguintes: desenvolver uma concepção de complexidade das noções e dos princípios de organização do «jogar»; balizar «concepto-metodologicamente» o princípio da rotatividade de jogadores; sistematizar procedimentos que tornam o princípio da rotatividade de jogadores uma necessidade nas equipas de Rendimento Superior.
Para o efeito, além de uma exaustiva pesquisa bibliográfica e documental, recorreu-se à realização de várias entrevistas a ex-jogadores, treinadores, académicos e a um analista de futebol internacional e comentador, que partilham preocupações relacionadas com o tema em apreço.
Através do cruzamento da informação entre a revisão bibliográfica e as entrevistas foi possível retirar as seguintes conclusões: pensa-se no «jogar» como interacção sistémica entre várias variáveis / dimensões mesmo quando apenas a uma se esteja a dar especial atenção; a rotatividade deve ser pensada e projectada no início de um período competitivo, tornando-se desta forma um momento ideal de aprendizagem, pois só jogando é que os jogadores conseguem evoluir. Torna-se assim essencial treinar a organização do «jogar» que se pretende desde o primeiro dia, visando a organização das ideias de jogo e a respectiva adaptação; a rotatividade é uma acção que os treinadores utilizam para potencializar todos os jogadores do plantel; a rotatividade acontece durante a semana no processo de treino, estando presente nos exercícios específicos para quando o jogador entrar em campo estar identificado com os princípios de jogo da equipa; a rotatividade só o é se for preparada, é um dos aspectos que deverá fazer parte do modelo de jogo do treinador; os processos de recuperação e rotatividade são decisivos, sendo fundamental reconhecer que é tão importante treinar como recuperar.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

OPINIÃO

Mister, como é que se combate o «PRESSING»?!!
por Ricardo Barreto
Esta simples pergunta, que pode ser feita a qualquer altura por um qualquer jogador, é capaz provocar em nós diferentes opiniões. Mas, atenção!!! Antes de se procurar uma resposta, importa não esquecer que, a todo e qualquer momento, poderemos estar a dar tiros nos pés! Porquê? É isso que eu vou procurar esclarecer.
No futebol actual, existem determinados princípios de jogo que são considerados fundamentais para que uma qualquer equipa seja considerada de TOP. Atrevo-me até a ir mais longe! Actualmente, as equipas que não manifestem com regularidade determinados princípios, não podem ser consideradas EQUIPAS DE TOP! O «Pressing» é um deles!!! Senão, reparem! Façam uma pequena viagem por algumas das grandes equipas, do passado e do presente: Ajax de Rinus Michels, Cruyff ou Van Gall, Milão de Sacchi, Barcelona de Cruyff, Real Madrid da «Quinta del Bultre», Porto e Chelsea de Mourinho, Manchester United de Fergusson, ou qualquer uma das equipas que esteve nas meias finais da Liga dos Campeões deste ano, Chelsea, Barcelona, Arsenal e Manchester. Pensem agora no que estas equipas apresentaram ou apresentam como padrão de jogo e logo o «Pressing» aparece como um fio condutor que as une, do passado ao presente!
Mas será que isto pode ser visto de uma forma tão partida, tão analítica, tão redutora? Parece-me que não. É verdade que as grandes equipas são pressionantes (embora não o sejam sempre… nem sempre da mesma maneira!) e são agressivas (no bom sentido do termo e não apenas defensivamente!). Não são passivas, mas antes activas, pois não esperam pelo erro do adversário, procurando antes provocá-lo. Contudo, parece-me claro que para estas equipas, o «Pressing» é apenas metade do caminho. Porquê? Porque depois de «destruir» (o jogo do adversário) vem a parte mais difícil: «construir», «criar»!!!... E como elas (as EQUIPAS DE TOP) «construiram» no passado e «criam» no presente!!!... De facto, para todas estas equipas, o «Pressing» é visto apenas como um meio para atingir um fim – a POSSE DE BOLA – e não como um fim em si mesmo. Mais acrescento, é aqui, nesta capacidade de coordenar/articular estes dois momentos diversos, mas interligados, de jogo – recuperação da posse de bola e sua manutenção – que muitas equipas apresentam grandes dificuldades. E é precisamente esta articulação que distingue uma EQUIPA DE TOP da «normalidade». Mais, da vulgaridade!
No entanto, para uma vertente «iluminada» de treinadores, a única forma de se combater o «Pressing» é… com mais pressão!!! Então, pedem sistematicamente «garra», «suor», «esforço», «correria», «agressividade» (no mau sentido do termo) aos seus jogadores. E os jogos transformam-se em autênticas batalhas campais, onde o respeito pelo adversário e pela essência do jogo deixa de fazer sentido. Aparecem os jogos com excesso de faltas, as agressões e lesões aos «magotes», as bolas pelo ar, o futebol aos repelões, onde o músculo procura abafar o talento e onde as equipas se sentem mais à vontade sem bola do que com ela!
Para estes «carrascos» do BOM FUTEBOL, queria apenas deixar uma reflexão final. Quando compramos um bilhete para ir a um estádio ver um jogo de futebol, é como se pagássemos um bilhete para ir ao cinema! Temos direito ao filme completo… do princípio ao fim! Recusamo-nos a ver apenas uma parte do «filme», reproduzida e repetida vezes sem conta!
E já estou a imaginar a entrega dos «Óscares» 2008/2009:
“ÓSCAR PARA MELHOR FILME: BARCELONA
ÓSCAR PARA MELHOR REALIZADOR: PEP GUARDIOLA
ÓSCAR PARA MELHOR ARGUMENTO: MODELO DE JOGO DO BARCELONA
ETC…
ETC…”
E isto sim, dignifica o Futebol, dignifica os Treinadores, dignifica os Jogadores … e também bate recordes de bilheteira!
Por favor, levantem-se!!! APLAUSOS para o BOM FUTEBOL.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

QUEM FALA ASSIM NÃO É GAGO

Se o sistema é aquilo que criamos como base do nosso jogo, para utilizar repetidamente, a estratégia funciona jogo a jogo, em função do adversário.
Jorge Jesus (1998)

sábado, 9 de maio de 2009

QUEM FALA ASSIM NÃO É GAGO

É a táctica que vai dar a dinâmica ao sistema de jogo, defensivo e ofensivo. Ou seja, é através da táctica que vamos entrar no modelo de jogo criado pela equipa técnica, é através dela que vai surgir a movimentação pretendida dos jogadores.
Jorge Jesus (1998)

sexta-feira, 8 de maio de 2009

QUEM FALA ASSIM NÃO É GAGO

O sistema é a base do jogo. É, digamos, a forma como colocamos os jogadores em campo, mas sem dinâmica, ou seja, a distribuição das unidades «mortas» pelo espaço.
Jorge Jesus (1998)

terça-feira, 5 de maio de 2009

FUTEBOL (COM) SENTIDO

Parte II
Pivô: farol ou rosa-dos-ventos

Uma das grandes riquezas do Futebol é a sua pluralidade, pois o Jogo contempla diferentes jogares e esse é um aspecto muito pertinente. É que daí surge a necessidade de cada um balizar conceptualmente aquilo que entende por jogar bem e definir de forma coerente o que pode fazer emergir tal complexidade singular: o jogar de cada um. Se assim não fosse, não faria sentido este tipo de discussões e troca de ideias, o futebol seria igual para todos e a unanimidade, com todos os seus perigos, reinaria. Paradoxalmente, mas sem qualquer contradição, há, contudo, no Futebol de qualidade alguns padrões, numa escala mais alargada, Macro (dos quais potencialmente podem emergir inúmeras subdinâmicas singulares num nível mais restrito, Micro), que podem ser identificados e que, como tal, deverão ser extensíveis à generalidade dos jogares que aspiram a tal categoria de qualidade.

Tal como refere o Nuno Amieiro, também entendo que “a posição 6 é crítica para se jogar bom futebol”. De facto, a função do pivô, quando este funciona como tal e não apenas porque ocupa aquela zona do campo, permite-lhe ser o “farol” que orienta a equipa sendo, desse modo, determinante para a funcionalidade colectiva em equipas que aspiram a um Futebol de qualidade e que assenta, como é referido mais uma vez pelo Nuno Amieiro, “num jogar mais apoiado e circulado, assente no bom jogo posicional de todos os jogadores … Um jogar onde o que corre é, fundamentalmente, a bola… para que a profundidade seja ganha com naturalidade e qualidade”.

Nas estruturas que contemplam a existência da posição, e pelo seu posicionamento em campo, o pivô estabelece relações directas com a generalidade dos jogadores da equipa. Para além disso, em determinadas estruturas, trata-se de uma posição onde a essência do Futebol, a Interacção, está potenciada, ainda que a nível formal e abstracto. Considero, assim, que a opção por este jogador como principal referência para a dinâmica ofensiva colectiva, quer em transição defesa-ataque como em organização ofensiva, pode consubstanciar um jogar de qualidade. Mas importa aprofundar as razões de tal convicção...

Desde logo, admiro as equipas que se sentem confortáveis a jogar na zona central, ainda que não hipotequem e façam questão de explorar a possibilidade da bola percorrer todo o campo, em largura e profundidade (negativa ou positiva), para se sentirem mais à vontade no meio quando a bola lá retorna. Ora, para a equipa o fazer, a qualidade do seu jogo posicional é determinante. E, neste ponto, o jogo posicional do pivô é decisivo, assim como o dos médios interiores que com ele estabelecem o triângulo que, tal como o campo, se quer grande. Contudo, só será grande se o pivô, que considero dever ser o mais posicional de todos os jogadores, estiver devidamente posicionado. Caso esteja demasiado recuado (como muitas vezes se observa alguns pseudo pivôs fazerem, ao ponto de baixarem para a linha dos centrais a pedirem a bola em construção, ou então, partindo de tal posição como sucede com os ditos “trincos” que, em organização defensiva, se juntam à linha do sector defensivo), o que se verifica é que os médios interiores são forçados a baixar e, por consequência, também os restantes jogadores mais adiantados, levando a equipa a perder profundidade. Ou então, não baixam e a equipa parte-se. Se, pelo contrário, o pivô se encontra demasiado adiantado, o triângulo fica pequeno, encurta ou deixa mesmo de o ser. Tal adiantamento do pivô retira espaço aos médios interiores e aos jogadores mais adiantados levando a menor espaço para a bola circular e finalizar, a uma diminuição do espaço e tempo para os jogadores executarem, a uma sobreposição de linhas e a uma aglomeração de adversários na zona central. Com tudo isto, torna-se difícil ver aquilo que tanto admiro: uma equipa a jogar no interior da outra.

O campo de futebol é grande e, além de poder andar perdido em profundidade, o pivô pode igualmente perder-se em largura, caindo ora num lado, ora no outro, tanto para pedir a bola em posse, como para efectuar acções defensivas nos corredores laterais em organização defensiva, saindo da sua posição, perdendo-se no campo, apagando-se, deixando de ser o “farol” da equipa que, como tal, se sentirá às escuras e à deriva. Mais, ao sair da sua posição central para zonas laterais, não deixa somente de ser a referência que deve ser na zona central, como retira espaço aos jogadores que jogam nessas zonas do campo, sem esquecer que leva os restantes médios a ajustarem-se, o que muitas vezes leva a uma grande densidade de jogadores em zonas laterais. Logo, não só não se verifica aquilo que tanto gosto, como se torna mais fácil para o adversário recuperar a posse de bola, pois se nós lá estamos eles vão para lá e aí têm a vantagem de jogar com um jogador extra cuja abrangência de espaço é enorme: a linha lateral. Percebe-se, então, por tudo o que referi, que o posicionamento e funcionalidade do pivô são determinantes para que uma equipa possa jogar no interior do adversário. Daí que eu faça a sua apologia.

Em transição ofensiva e em organização ofensiva, este jogador deverá não somente ser um “farol”, mas também uma “rosa-dos-ventos”, um ponto de referência, não muito móvel, que torna possível à equipa jogar no sentido de “todos os rumos determinados pelos pontos cardeais” e que, além disso, lhe mostra e leva a reconhecer tal possibilidade. Que implicações tem isto nos momentos de transição ofensiva e de organização ofensiva? Imensas! Mais variabilidade, mais imprevisibilidade, mais qualidade e, claro, para o adversário, mais dificuldades.

Importa, contudo, advertir que para ser o “farol” e a “rosa-dos-ventos”, ou ainda “o epicentro de toda a dinâmica ofensiva colectiva”, como refere o Nuno Amieiro, tem de haver critério na escolha de tal jogador. No meu entendimento, este jogador deverá ser muito posicional e capaz de reconhecer que a mobilidade no Futebol, por vezes, implica não se mover, saber estar e ficar, sem roubar espaço aos restantes jogadores, garantir sempre diagonais de passe para poder jogar com regularidade de frente para o jogo, funcionar como apoio recuado em zona central para os jogadores que jogam à sua frente, não se esconder do jogo, ter qualidade e variabilidade de passe, possuir critério na identificação dos timings de entrada da bola, noção de ritmo e um adequado entendimento da velocidade de jogo. Logo, não serve um qualquer. Se não satisfizer muitos destes requisitos, não será a “rosa-dos-ventos” que a equipa necessita, mas antes um “cata-ventos” que vai para onde o jogo e os adversários o levam.

Retomando o problema da apologia simultânea do pivô e do “médio transportador”. Também eu penso tratar-se de um erro, sendo de realçar que, no meu entendimento, o emprego pelo Nuno Amieiro da palavra “simultaneamente” é um preciosismo de enorme pertinência. Concordo, igualmente, com a impossibilidade de ligar a lógica do “médio transportador” com a do pivô em momentos simultâneos do jogo, uma vez que as repercussões que as subdinâmicas do “médio transportador” têm em sobreposição às do pivô, são nefastas e hipotecam a possibilidade deste último o ser.

Assim, sem dúvida que haverá um divórcio, ou melhor, não haverá... por não poder haver casamento! A existência de um “médio transportador” nos primeiros momentos de construção retira ao pivô a preponderância e funcionalidade que este deve ter em tais circunstâncias, fazendo-o desaparecer do jogo. Um dos noivos não aparece ou participa no casamento, por lhe ser retirado espaço e tempo, preponderância, sendo ainda muitas vezes obrigado a baixar ou a ocupar zonas estranhas que, no seguimento, implicam um recuo da equipa que, das duas uma, ou sente dificuldade em dar profundidade ao jogo ou, mantendo-se profunda, acaba por se partir.

Jorge Maciel

segunda-feira, 4 de maio de 2009

VALE A PENA LER DE NOVO

O jogo do título
O jogo do título ensinou-nos várias lições mas, em contrapartida, deixou que dele se tirassem conclusões que, do meu ponto de vista, são erradas. Não foi um bom jogo, porque foi árido, porque as duas equipas se ralaram mais em anular o adversário – anulando-se a si próprias no processo – do que em colocar em campo as suas armas. Foi aquilo a que os especialistas gostam de chamar um jogo táctico, como se tal coisa pudesse existir e só uns quantos iluminados pudessem dela tirar gozo. Mas não só isso não existe, como o que há são jogos em que o medo se impõe ao prazer, em que o rigor se impõe à criatividade, em que a luta se impõe ao talento. Em que a vontade de não perder é superior à de ganhar. Foi isso que vimos todos no Bessa. E por mais que queiramos iludir-nos com noções de competitividade, o que aconteceu foi um jogo aborrecido. Jogado nos limites, é verdade, mas onde uma folha de papel chegaria para anotar todos os lances relevantes. Um jogo com muito empenho, mas pouco espectáculo a justificar os 75 euros do bilhete cobrado à entrada.
António Tadeia, no jornal Record de 5 de Abril de 2002
(artigo publicado com a autorização do autor)

domingo, 3 de maio de 2009

VALE A PENA LER DE NOVO

Ganharam 0-0
Foi surpreendente a quantidade de opiniões favoráveis que teve a estratégia do Chelsea: com perseguições individuais, centrocampistas de grandíssimo nível que não pisaram a área contrária, interrupções frequentes para interromper o ritmo do Barcelona... O negócio saiu-lhes redondo porque encontraram o 0-0 que procuravam. Só por isso, para certa crítica, já obtiveram a patente de equipa inteligente. O que me parece incrível é a pouca generosidade que temos para com as equipas que assumem o risco, o jogo, futebol grande. Só ganham o elogio quando ganham o jogo. Ao invés, os espectadores aplaudem os empates ainda que seja à custa de varrer o espectáculo.
Jorge Valdano, no jornal A Bola de 2 de Maio de 2009
Nem de propósito
Os dois posts que se seguirão surgem no seguimento do meu último Ideias Soltas onde, mais do que criticar a estratégia de Hiddink frente ao Barcelona na passada terça-feira, tentava evidenciar aquela que é a minha noção de Táctica.
O primeiro post é um dos artigos que Valdano escreveu ontem no jornal A Bola. Nem de propósito...
O segundo é um excerto de um texto de António Tadeia que, por acaso, hoje encontrei. Conseguirão lembrar-se de que jogo fala Tadeia? É que, nem de propósito...
Nuno Amieiro

sexta-feira, 1 de maio de 2009

IDEIAS SOLTAS

Muito táctico?! Sim, o Barça...
Facilmente se constata o quanto é comum adjectivar-se de “táctico” um jogo muito defensivo de uma equipa, onde são evidentes grandes preocupações com determinados jogadores adversários, onde a grande missão colectiva quase se resume a anular o jogo adversário. Em suma, onde a grande preocupaçãp passa muito mais por não sofrer golos do que por marcá-los. Muitas vezes, nem é uma das equipas. São as duas. Um jogo mal jogado de parte a parte que alguém resolve adjectivar de “táctico”, no sentido de meter alguma água na fervura... numa espécie de redenção intelectual face àquele que foi um espectáculo deprimente.
Ora, como foi isso que vimos da parte do Chelsea na última quarta-feira europeia em Camp Nou, provavelmente quase todos, senão mesmo todos os que lêem este texto, ouviram da parte de quem comentava o jogo, em directo, afirmações do tipo “o jogo está a ser muito táctico”, porque “estamos a assistir a um Chelsea muito táctico” ou, já em jeito de resumo final nos últimos minutos do encontro, “o Chelsea, no lado táctico, esteve tremendo”. Bem, pelo menos no canal onde vi o jogo, expressões semelhantes ou com o mesmo sentido foram repetidas várias vezes...
Portanto, segundo o entendimento de alguns, uma equipa que, praticamente, apenas jogou meio jogo, o defensivo, é “muito táctica”, tremenda no “lado táctico”... Como se a táctica se esgotasse nas coisas do jogar que têm a ver com o defender, com o anular pontos fortes do adversário, com o cumprir a intenção inicial de, acima de tudo, não sofrer golo.
Para mim, o lado táctico tem a ver com o jogo todo e, nessa medida, o primeiro elogio a ser feito teria de ser dirigido à equipa de Guardiola. Para mim, falar de táctica é falar de intenções e de interações e, neste sentido, o jogar do Barça mostrou (e tem vindo a mostrar, por vezes de forma excepcional) maior riqueza e complexidade táctica. Foi, por isso, aos meus olhos, muito mais táctico do que o do Chelsea. Basta ver o modo como a equipa responde, perto e longe da bola, à progressão com bola de Piqué pelo corredor central. Ou o modo como ocupa o espaço a atacar e faz a bola circular. Ou o modo como “acampa” no último terço e mete a bola a correr, rente à relva, na procura do espaço e do momento certo para tentar finalizar. Ou o modo como recusa cair na tentação do pontapé longo ou do cruzamento cego para dentro do “aquário”. Ou o modo como responde à perda da posse de bola e, desse modo, poucas vezes é obrigado a “desmontar as tendas”. Tudo isto revela critérios. Tudo isto é construção (táctica) do treinador.
Por isso, sim. Também acho que o Barcelona-Chelsea foi um jogo muito táctico. Mas, sobretudo, pelo que nos mostrou o Barça. Sabem como jogou? Então sabem do que falo, sabem o que é a Táctica para mim. Ela é o fio invisível que faz emergir aquilo que reconhecemos como traços marcantes do jogar de uma equipa.
Nuno Amieiro